Por: Ariovaldo Ramos*
“No décimo quinto ano do reinado de Tibério César, sendo Pôncio Pilatos governador da Judéia, Herodes, tetrarca da Galiléia, seu irmão Filipe, tetrarca da região da Ituréia e Traconites, e Lisânias, tetrarca de Abilene, sendo sumos sacerdotes Anás e Caifás, veio a palavra de Deus a João, filho de Zacarias, no deserto.” (Lc 3.1-5)
“Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele, comigo.” (Ap 3.20)
“Seguiram os onze discípulos para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes designara. E, quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram.” (Mt 28.16-17)
Os textos acima demonstram que Deus sempre contou com pessoas corajosas para levar as suas notícias; pessoas que tiveram coragem de escrever e de denunciar o que estava acontecendo para que todos soubessem quais eram as lutas de Jesus.
Deus expulso do templo
Em Lucas 3.1-5, o evangelista afirma, corajosamente, que Deus foi expulso do templo. Quando Anás e Caifás eram sumo sacerdotes, veio a palavra de Deus a João, filho de Zacarias, no deserto. Deus havia sido expulso do templo e agora estava no deserto. A declaração de que havia dois sumo sacerdotes denota contradição, pois, por definição, só pode existir um sumo sacerdote. Porém, a tradição paralela nos ajuda a entender os acontecimentos.
Os romanos entraram em Israel sem precisar lutar. Eles foram para lá arbitrar um problema entre dois candidatos a rei, e descobriram que a melhor forma de controlar o povo, que se sublevava a todo tempo, era influenciar a escolha do sumo sacerdote. Então Anás, sujeito esperto, ladino, político populista, fez um acordo com os romanos e se tornou o primeiro sumo sacerdote dessa nova safra. Cada um de seus cinco filhos foi sumo sacerdote e, quando ele não tinha mais filhos para nomear, nomeou o genro, Caifás. Nos bastidores, ele estava no controle o tempo todo. Foi assim que o templo foi tomado pelos romanos.
Para ser sumo sacerdote em Israel, não bastava ser da tribo de Levi, era preciso ser da família de Arão. E João era filho de Zacarias, casado com uma das filhas de Arão (Lc 1.5). Logo, não fossem o estratagema dos romanos e a esperteza de Anás, João teria sido o sumo sacerdote.
João se declarava assim: “Eu sou a voz daquele que clama no deserto”, ou seja, Deus. Às vezes brinco, dizendo que Deus teria falado a João: “Já que é a turma de Anás que está usando vestes talares, você vai usar pele de camelo. Assim você fica diferente e ainda marca o meu protesto. São os romanos que estão comendo a comida sagrada que seria destinada a você; então você vai comer gafanhoto e mel silvestre”. Deus fez o protesto contra Roma da forma mais plástica possível. Levou seu sumo sacerdote com ele para o deserto e deu-lhe uma roupa que denunciava a perda da consciência do sagrado por parte de Israel. E contou com o corajoso Lucas para, numa época marcada pela força do Império Romano, dar essa notícia.
Anjos de asas quebradas
Na passagem de Apocalipse 3.20, João afirma que Jesus foi expulso da igreja. O Novo Testamento começa com Deus sendo expulso do templo e termina com Jesus sendo expulso da igreja. Isso explica por que apanhamos tanto quando tudo que queremos é a igreja. Descobrimos que os adversários da igreja estão vestindo vestes talares, e são eles que estão expulsando Deus do templo e Jesus da igreja. Nem sempre os que usam vestes talares estão ajudando Jesus a construir a igreja. E Jesus contou com um outro servo corajoso para nos contar isto.
O anjo da igreja de Laodicéia havia ficado rico. O texto bíblico afirma: “Ao anjo da igreja em Laodicéia escreve: Estas coisas diz o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus: Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente. Quem dera fosses frio ou quente! Assim, porque és morno e nem és quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da minha boca; pois dizes: Estou rico e abastado e não preciso de coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu.” (Ap 3.14-17, ARA).
Essa é a imagem de uma igreja que decidiu ficar rica e foi derrotada pela riqueza. Como Jesus não convive bem com Mamon, a igreja expulsou Jesus. A beleza destas cartas do Apocalipse é que Jesus tem problemas com um ou outro anjo da igreja, mas conta com pessoas de dentro da igreja que, embora sob a influência desse anjo de asas quebradas, continuam tendo ouvidos pra ouvir o que o Espírito diz às igrejas. Novamente, Deus precisa de gente que tenha a coragem de dar a notícia de que o Espírito continua falando à igreja, jamais desistiu dela, que Deus nunca desistiu de ter o sumo sacerdote. Ainda que no deserto, ele nunca desistiu e nunca desistirá de alcançar aquilo que propôs no dia em que avisou, no jardim do Éden, que a semente da mulher esmagaria a cabeça da serpente. Ele não mudou de idéia. E levanta pessoas pra contar a notícia, inclusive para nos alertar de que essa tarefa não vai ser fácil.
Em Mateus 28, temos a seguinte passagem: “Seguiram os onze discípulos para a Galiléia, para o monte que Jesus lhes designara e, quando o viram, o adoraram, mas alguns duvidaram”. Eram apenas onze homens, e entre eles a primeira coisa que aconteceu foi a divisão da igreja: uns adoraram e outros duvidaram. Essa divisão continua e se sustenta numa única questão: aqueles que têm e aqueles que não têm fé, aqueles que adoram e aqueles que duvidam. A nota triste dessa notícia do evangelista é que o grupo que duvida também faz parte dos discípulos. Os que o adoram pagarão qualquer preço, e os que duvidam poderão, quem sabe, até aparelhar a igreja pra si, para os seus interesses ou para interesses escusos. Porém os adoradores os enfrentarão, dizendo: “Não é assim. A igreja não é isso. A notícia que Deus manda para a igreja é esta: Jesus ressuscitou! Ele está vivo!”
Lucas e João faziam parte daqueles que receberam a revelação, mas estes têm sido comunicados pelos que receberam iluminação. Essa iluminação significa que a notícia precisa ser contada e recontada à exaustão, geração após geração. A batalha só vai terminar quando soar a última trombeta. Então Jesus vai encontrar-se com seus discípulos, aqueles que o adoraram na história, que não se calaram diante dos que duvidaram, que não abandonaram a verdade, que não abriram mão de lutar com Jesus pelo que ele sonhou e construiu com seu próprio sangue. Independente dos anjos de asa quebrada que de vez em quando encontramos liderando a igreja, independente do fato de que aqui e ali gente nossa faz acordo com o inimigo, entrega o templo aos romanos, o Espírito continua falando à igreja, e ela permanece inabalável, invencível, em adoração ao ressuscitado. Essa tem sido a batalha da igreja, e é muito bom que Deus sempre pôde contar com gente que tem coragem de dar as notícias. Ultimato tem sido uma porta-voz das notícias de Deus.
Haverá momentos em que o púlpito será o maior responsável pela expulsão de Jesus, como aconteceu em Laodicéa. Porém, sempre haverá também os que ouvem e os que insistem em contar pra todo mundo: “Olhem, independente do púlpito, o Espírito continua falando à igreja; Deus não desistiu da sua igreja”. Graças a Deus por ter feito isso por meio de homens frágeis, mas que acreditaram.
Eu também estou completando 40 anos... de conversão. É um privilégio participar da comemoração dos 40 anos desta revista, porque muitas vezes, no meio de uma avalanche de loucuras que se abateu sobre a igreja brasileira, eu recebi notícias do Espírito Santo por meio de Ultimato, dos irmãos que escreveram para contar que o Espírito Santo ainda fala à igreja. Essa notícia é muito importante, porque no meio de toda essa batalha mesmo os que adoraram o ressuscitado às vezes começam a se perguntar: “Será que não somos nós que estamos errados?” Pois quando os romanos tomam o templo eles adoram, e quando os anjos de asa quebrada ficam ricos eles constroem catedrais. O poder político e o poder do dinheiro intimidam. Às vezes olhamos para as mãos, para os pés e dizemos: “Não dá para sair nada daqui! Essa gente é forte demais”. Então precisamos que chegue aos nossos ouvidos alguém dizendo: “Tenho notícias do Espírito Santo para você”.
O anjo e o púlpito expulsaram Jesus, mas ele continua insistindo com a igreja. Os romanos expulsaram Deus, mas ele ainda está falando do deserto. Alguns discípulos duvidam, mas os que o adoram estão vivos e vão continuar firmes até que o ultimato se cumpra e a última trombeta seja tocada. Guardadas as devidas proporções, a revista Ultimato tem prestado serviço semelhante ao de Lucas e João. Que Deus seja bendito por sustentá-la nestes 40 anos. Durar 4 anos já é uma proeza; 40 só pode ser milagre! Que Deus nos abençoe!
* Ariovaldo Ramos é pastor na Comunidade Cristã Reformada e na Igreja Batista de Água Branca, ambas em São Paulo.
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