quinta-feira, 25 de novembro de 2010

“Ankniipfungspunkt” - Uma Breve Avaliação da Antropologia de Emil Brunner

POR: Idauro Campos

INTRODUÇÃO:

Nesta reflexão tentaremos, de uma forma breve e resumida, compreender e interagir com as idéias do teólogo suíço Emil Brunner que, à semelhança de Karl Barth, se posicionou a favor da conhecida Teologia Dialética, movimento que criticou a Teologia Liberal e propôs uma recondução da teologia em direção ao pensamento dos reformadores. Entretanto, apesar da concordância com alguns postulados de Barth, Brunner estabeleceu seu próprio caminho em algumas de suas formulações e que o levou a ser criticado pelo próprio Karl Barth. Nosso objetivo é sintetizar o centro das idéias brunnerianas e tentar identificar sua relevância para o presente da teologia.

Podemos dizer que, à semelhança de Karl Barth, Emil Brunner se manteve na fronteira teológica que caracterizou o século 20, pois com sua abordagem criticou o liberalismo que julgava a razão como critério de avaliação da verdade. Ao mesmo tempo Brunner também não agradou os conservadores protestantes, pois com sua “ Imago Dei”, negou os efeitos mais drásticos do pecado no homem, considerando este com um ser que ainda é dotado de inclinações espirituais que o aproximem de Deus. Portanto, em sua Dialética, Brunner encoleriza os liberais, sem, contudo, agradar aos conservadores, que esperavam uma dogmática mais calvinistas em sua antropologia e hamartiologia.


A DIALÉTICA

Para Brunner, há uma tensão entre a Palavra de Deus e o pensamento do homem. Enquanto que para os liberais, a Revelação pode ser conhecida através das faculdades naturais da razão, Brunner declara que tal evento só é possível não em função da razão, mas sim da contradição entre razão e revelação, Deus e o homem, lei e Evangelho, ou seja, é através desta contradição que a verdade sobre Deus pode ser captada, pois Deus, sendo eterno e santo, entra no tempo em busca do homem pecador. É sob esta perspectiva que a teologia deve ser feita. Portanto, teologia dialética é a reflexão que respeita as fronteira da religião e a da razão, porque são paradoxais entre si. Com este posicionamento, Brunner acentua que a Revelação, sendo transcendental, não pode ser domesticada pelo pensamento, pois este se conforma em apenas compreender ou “possuir”, e não em crer.

Desta forma então, podemos discernir em alinhamento das idéias de Brunner com as de Barth, pois para o teólogo da Basiléia a contradição entre Deus e o homem, significava a limitação do segundo em alcançar o primeiro. Deus sendo “o totalmente outro”, não pode ser alcançado pela razão em função desta ter sido prejudicada por causa da queda. No entanto, há uma trincheira entre os dois teólogos, pois para Emil Brunner esta “incapacidade” não é total e plena. O homem, segundo ele, é capaz de voltar-se para Deus e compreendê-lo, pois a queda não destruiu completamente esta possibilidade. Ainda há no homem as condições que permitam seu contato com o Sagrado. Portanto, Brunner diz que a contradição entre Deus e homem age no mesmo como uma “força de atração”. São opostos e, logo, se atraem. Com esta compreensão, fica então patente que Emil Brunner, é claro, não concorda com a depravação total tão defendida pelos calvinistas e de quem Barth sentia-se alinhado. Para Karl Barth não há nada no homem que o torne em condições naturais de receber a Revelação de Deus, pois o mesmo se encontra em total estado de queda e depravação. Ainda que seja possível para este a realização de boas obras, que visem minorar os sofrimentos humanos, tais inclinações não são intensas a ponto de nos colocar favoravelmente diante do Criador. Destarte, a contradição entre Deus e o homem é incongruente. Deus é pura transcendência e não pode ser objeto da razão, pois esta está aprisionada pelo pecado. Já a insistência de Brunner em enxergar no homem uma capacidade inerente, o levou a ser fortemente criticado por Barth. Brunner, aliás, passaria o resto de sua vida tentando se explicar e se defender das acusações de Karl Barth, que via em suas formulações uma reaproximação com a teologia católica da apreensão natural do homem sobre a revelação.

O PONTO DE CONTATO

Para explicar a maneira como seria possível ao homem chegar a Deus por meios inerentes, mesmo admitindo que o mesmo é um ser atingido, manchado e alijado pelo pecado, Emil Brunner desenvolve um conceito que ele chamou de “Ankniipfungspunkt” ou “ponto de contato”. Assim, a razão humana é dotada de uma disposição natural para receber a revelação de Deus. Vejamos como ele a define:

“Se o homem fosse apenas um objeto em que Deus faz alguma coisa, um recipiente no qual Ele derrama alguma coisa, então se poderia falar da revelação mesmo sem conhecer nada do ser que sofre a ação. Contudo, já que ela é um encontro pessoal, é necessário aprender a conhecer a pessoa a cujo encontro Deus vai e o modo como essa pessoa se apresenta para tal encontro com Deus... O fato de que Deus se manifesta mediante sua Palavra pressupõe que o homem seja um ser criado para esse gênero de comunicação através da Palavra... Esse fato, já evidente em si mesmo, deve ser tanto mais fortemente ressaltado quando se sabe que uma falsa explicação da sola gratia e o temor de cair na doutrina pelagiana ou na do sinergismo levaram a ponto de trocar a pura receptividade do homem na Revelação por uma passividade objetiva, em que à parte do homem poderia ser geralmente eliminada”.

Ou seja, se Deus ao se manifestar não encontra um homem que lhe seja idôneo para corresponder-lhe, tal manifestação seria desnecessária. Ele só o faz porque o homem mantém suas faculdades em condições de atender o Criador. O homem pode receber a Palavra e o Espírito Santo, pois ele tem um “ponto de contato”, uma “imago Dei” formal, que foi mantida a despeito do pecado.


Ao ser duramente criticado por Karl Barth, Brunner se defendeu dizendo que sua formulação não negava a doutrina reformada de “sola gratia”, pois este “ponto de contato” era apenas a capacidade não perdida de receber a Palavra, no entanto, o “crer” e “ouvir” dependeria da própria Palavra de Deus. Ou seja, todo homem é capaz de receber a Palavra de Deus, mas crer nesta Palavra depende da própria Palavra, pois a fé é uma obra divina e é a própria Palavra que a comunica.

Para Emil Brunner há a perfeita coordenação entre a Graça e a Razão, visto que a primeira, sendo de caráter subjetivo, nos fornece um conhecimento de Deus mais eficiente, pois a razão, que é de caráter objetivo e natural, nos fornece também um conhecimento sobre Deus, porém “opaco e incerto”. Portanto, Brunner não exclui o conhecimento natural, porém o considera incompleto, sendo, então, necessária à influência da graça divina. Este conhecimento natural defeituoso e insuficiente é sim fruto do pecado, mas é existente, pois o pecado não aniquilou o conhecimento do homem sobre Deus e sim o fragilizou e, por causa disso, a dependência de Deus continua, apesar do pecado.


CONTEXTUALIZAÇÃO


Mesmo que inconsciente a teologia de Brunner se faz sentir no evangelicalismo contemporâneo, pois apesar de não se falar em uma “bondade inerente” ou conhecimento próprio, o movimento evangelical no Brasil, na prática, abandonou as doutrinas da depravação total e “sola gratia”. A devida miséria e incapacidade humana em se achegar a Deus não são mais acentuadas. Fala-se muito nas pessoas que estão com “sede de Deus” e “tomar posse”, pela fé, como se esta fé pertencesse ao homem, podendo este, quando bem quiser, depositar em Jesus. Não se fala mais de um pecador perdido, morto espiritualmente em delito e pecado e que se não for pela graça de Deus para regenerá-lo dando-lhe o dom da fé, o mesmo está condenado. A forma como a evangelização é feita não leva em conta a total dependência do homem em relação a Deus para ser salvo. É como se à parte de Deus já estivesse feita e agora quem age é o homem que basta depositar sua fé. Ou seja, há no próprio homem o poder para crer. O seu livre-arbítrio é a faculdade que toma a decisão, ou não, de abraçar o Cristo da fé. Portanto, ainda que não se fale uma “imago Dei” presente no homem, ou, em “ponto de contato”, a forma como o evangelicalismo se desenvolve no Brasil se alinha com as convicções de Emil Brunne



CONCLUSÃO

Seria o Brunnerianismo uma forma de semipelagianismo? Parece-nos que sim, pois o semipelagianismo, típico do evangelicalismo contemporâneo, admite um homem que é um pecador, cujas faculdades foram corrompidas em função do lapso no Édem. No entanto, também admite que este pecador, apesar de seu estado de escravidão espiritual, pode por si mesmo chegar a Deus. É claro que o semipelagianismo declara que a salvação pertence ao Senhor e que o pecador é salvo pela graça, porém está é apenas uma influência sobre o pecador, que tendo condições de se voltar para Deus, recebe tal influência e decide se entregar. É desta forma que se evangeliza no Brasil. Assim, empregando os métodos adequados, dizem eles, o homem virá a Deus.

Apesar de seu protestantismo, Brunner não considerou os efeitos completos da queda. O homem está morto. Não há nele sequer a menor condição de uma reconciliação. O homem natural segue o curso do próprio coração (Ef. 2: 3) e está separado de Deus. Sua única chance é a graça que regenera, comunica a fé e promove o arrependimento. É a graça de Deus que restaura e redireciona as faculdades do homem, garantindo assim, eficazmente, o acesso à reconciliação com Deus.

Um comentário:

  1. a verdade que os grandes homens da mindia não estão enteresado em salvação e sim tira lucro delas . prega sobre arrependimento ,não da ibobe ,assim eles pensam e agem.

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